segunda-feira, 7 de dezembro de 2009

O Espaço e o Tempo de um Olhar

Naquela altura os dias eram enormes e cheios de sol.
A realidade estava disfarçada ainda; era algo longínquo e apenas futuramente alcançável; era promessa de futuro entre gargalhadas genuínas; Era pura e tão nua.
Hoje, aquele sítio é imagem. Só. É fotografia de memória com nostalgia; é o agarrar o passado com a coragem da imaginação.
E agora aqui, perdida no meio dos neons do mundo, não sei quem sou nem quem vou ser.
Times Square está cheia de rostos e de vidas que petrificam o meu olhar.
Sou chamada por mil vozes, por mil tons, por mil imagens sobrepostas...
Sou chamada ao mundo pela minha solidão.
E penso: 'Não posso estar só no meio da multidão desta metropole.'
Estou no centro do mundo e as ruas, os prédios, as pontes, os carros, os passeios e passadeiras estão cheios de seres meus semelhantes. Mas iguais?  Iguais até que ponto?
Os meus olhos não vêem o mundo deles e será que lhes posso pedir que vejam o meu?
A solidão não é estar sozinho.
Solidão é só a forma nua do nosso olhar quando vê.
Quando vê o em si no para além de si.
É o puro e simples ser-aí.
E o meu olhar voa. E repara. E volta a ganhar asas. E volta a estagnar.
Que força têm estas coisas, exteriores a mim, que me raptam os sentidos, que me transportam para lugares longínquos, que palavras não há para as designar?
Quem são estes olhos que me rodeiam, que estão em toda a parte e que me olham de perto. Olham para mim ou através de mim? E o que vêem eles?
São fotografias mentais. De mundos diferentes.
E quem sou eu aqui, parada no meio do meu mundo?
Entre a solidão e a vontade, entre o eterno do mundo e o finito do que sou, não sei o meu nome.
E então o som do piano chama-me, e o violino sobrepõe-se, e a guitarra chega no exacto momento em que a imaginação faz música sem pauta.
E a imagem, a imagem é o retrato vivo do que a minha imaginação fez com o som.
A letra chega, as palavras misturam-se na música e então eu viajo.
Sem chão, sem céu, sem olhar e sem ver.
De olhos fechados o mundo aparece.
O meu mundo instala-se e sobrepõe-se a qualquer realidade existente.
E eu, afinal, sou música sem pauta, perdida em palavras que são imagens num mundo que é só meu.


TR